segunda-feira, 9 de abril de 2012

A aposentadoria de um Geraldino...



Por ocasião da morte de Tom Jobim, Chico Buarque declarou que não tinha mais para quem mostrar as suas canções. Segundo Chico, era a opinião do genial Jobim que ele buscava escutar sempre que fazia uma música. Há algo desse sentimento, dessa tomada de consciência de um vazio, em todos os juízes fluminenses (aqui eu me incluo) que torciam para que suas sentenças fossem apreciadas em grau recursal pelo professor Geraldo Prado.
                    Um juiz que... gosta de samba e futebol. Um legítimo carioca que é motivo de orgulho, não só para os amigos (e aqui me incluo, novamente), como também para todos aqueles que compreendem o que é a democracia. Um juiz que gosta e sofre com o povo: um juiz como todos deveriam ser...
Geraldo aposentou-se (ou, segundo o próprio, trocou de trincheira) na última semana.  Para homenageá-lo, segue parte do texto escrito para a apresentação do livro lançado em sua homenagem:



"Nas crônicas de Nelson Rodrigues que retratavam o mundo do futebol (uma das paixões de nosso homenageado, habilidoso atacante) nasceu a expressão “geraldinos e arquibaldos”. Em oposição aos “arquibaldos”, os bem comportados ocupantes das arquibancadas dos estádios de futebol, espaço da burguesia e dos torcedores mais conservadores, aparecem os “geraldinos”, representantes das classes subalternas, o povo que só comprava ingresso para assistir aos jogos em pé “na geral”, locus dos personagens mais irreverentes, criativos e combativos. Também inspirado no clima dos estádios de futebol, e do Maracanã em particular, Luís Gonzaga do Nascimento Júnior, o Gonzaguinha, compôs “Geraldinos e Arquibaldos”, letra e música com forte conotação política, que através da metáfora do futebol retrata o  comportamento do brasileiro em meio ao jogo da vida (“E esse jogo tá um osso/ É um angu que tem caroço”), que se desenvolve “no campo do adversário”. Por evidente, o paralelo entre “geraldinos” e “arquibaldos” remete ao confronto entre grupos políticos nascidos da Revolução Francesa, os Jacobinos e os Girondinos, a esquerda e a direita, aqueles que lutam para mudar e os que se conformam com o status quo.
 Na arena jurídica, Geraldo Prado nunca deixou dúvidas: sempre foi um inconformado com a injustiça social, com o processo de exclusão/extermínio de parcela da sociedade. Com a coerência daqueles que sabem que, sob certo aspecto, a divisão entre teoria e prática é artificial, Geraldo forjou sua produção, tanto na academia quanto nos órgãos judiciais em que atuou, a partir de um compromisso com o “outro”, com a diferença, com “os de baixo”, com aqueles que, criativos, combativos e, por vezes, até irreverentes, lutam em meio às adversidades para (sobre)viver. Em suma, Geraldo Luiz Mascarenhas Prado, em suas sentenças, acórdãos e livros, produziu textos geraldinos.
Sem ignorar que o direito burguês surgiu como obstáculo à transformação social, ciente de que o sistema penal brasileiro foi historicamente utilizado como forma de controle da população indesejada, Geraldo assumiu a posição que se espera de um intelectual que não se perde em abstrações metafísicas: tomou conceitos do âmbito do direito, da filosofia, da antropologia, da sociologia, da política e da história e colocou-os a serviço do projeto constitucional de vida digna para todos; fez da teoria que produz um instrumental da guerrilha – da luta por posições emancipadoras - que trava tanto nas salas de aula em que leciona e nos livros que escreve quanto no tribunal em que exerce como poucos a jurisdição. Impossível, em se tratando de pessoas coerentes como ele, imaginá-lo atuar burocraticamente, insensível aos dramas humanos potencializados pelo abandono do Estado Social e sua progressiva substituição pelo Estado Penal.
Nascido em 05 de abril, graduado em direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre (1998) e doutor em Direito pela Universidade Gama Filho (2003), com estudos de pós-doutoramento na Universidade de Coimbra, Geraldo Prado lecionou em diversas universidades fluminenses (UCAM, UGF, UVA, UNIG, FDC, UNESA, dentre outras), tanto na graduação quanto em programas de pós-graduação, e atualmente é professor da histórica Faculdade Nacional de Direito (UFRJ). Mais do que alunos e colegas de cátedra, Geraldo colecionou ao longo dos anos dedicados ao ensino do direito um enorme rol de amigos, admiradores e seguidores.
Fundador do Movimento da Magistratura Fluminense pela Democracia (MMFD), membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD), do Instituto Carioca de Criminologia (ICC) e do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), Geraldo Prado lutou, conquistou vitórias e sofreu derrotas (que confirmam sua posição de vanguarda) na busca da radical democratização da sociedade brasileira (...)".


Valeu, meu amigo: novos desafios te esperam...

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