A polícia, tanto na ditadura quanto na democracia, é utilizada para o controle das populações indesejadas. O que acontece quando a própria polícia adota praticas indesejadas à elite, contrárias aos desejos daqueles "capazes de deter a riqueza e o poder" (ROSE, R. S. The unpast: a violência das elites e o controle social no Brasil de 1954 a 2000. Trad. Richard Boike. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Massangana, 2010, p. 19)?
Seguem dois textos que tocam a questão da greve dos policiais. Duas perspectivas democráticas (e antagônicas)...
Greve dos Policiais: Ilegalidade?
Edmundo Arruda
Titular/UFSC
O argumento é simples. e parte de Marx. A luta de classes é o motor da história. Essa luta pode apresentar configurações históricas específicas, situando-se no terreno central dos países de capitalismo "avançado" ou situar-se na zona de transição dos países em via de desenvolvimento, mais ou menos periférios, ou já situados num plano de reconhecimento entre os mais ricos do mundo, caso do Brasil, hoje entre os cinco que mais produzem riqueza no planeta.
Nada pára a luta de classes, nem mesmo as trapalhadas do socialismo reais e dos defensores de um socialismo que dispensa uma radical revisão histórica. A conflituosidade é inerente ao homem como marca de sua subjetividade adquirindo um caráter mais genérico e ao mesmo tempo mais cruel na exata medida em que se ampliam as relaçoes sociais de produção construídas na mais valia e na não socialização dos ganhos da mesma. Marxista ortodoxos podem estar absolutamente na posiçao de ex-reis nus mas o velho Marx estará completamente coberto de razão na elucidação das leis que comandam o mercado capitalista em suas mais diversar emergências, até chegar aos oligopólios financeiros.
Ao lado dos detentores dos meios de produção haverá sempre os abaixo do vértice da pirâmide estrutural do social naquele tipo de sociedade, vale dizer, trabalhadores, colarinhos azuis ou brancos, a maioria tem que sair à luta, mais ou menos capacitados, para sobreviver, Essa é a base da produção e da repdorução social. O resto é blá blá blá de sociologos que apaziguam a dramaticidade do quadro imoral em que vivemos, com seus danos ecológicos, a começar pela condenação à minoridade existencial milhoes de seres humanos, e o meio ambiente em si, em face da relação predatória que pressupôe em face da natureza.
Isso posto entro na questão da greve dos policiais, Bahia, Rio, co características que se disseminam para quase todos os estados da federação. Fico surpreso vendo o Ministro da Justiça, Cardozo, enquadrando os próceres do movimento como homens fora da lei. Penso nos discursos da presidenta, Dilma, enfatizando a idéia de ordem a ser mantida. Foi uma avalanche de discursos que me deixaram estonteado de tanta mudança de comportamento de ex-revolucionários e gente de esquerda que d'antes organizaram movimentos grevista, Volta Redonda incluída e tantos outros, durante duros tempos da ditadura militar. Ontém tinham a legitimidade das pedras contra as vitrines, hoje a legitimidade dos que tendo telhado de vidro falam em nome do patrimônio e da democracia.
Por certo que há um estatuto particular para funcionários públicos em áreas prioritárias e de segurança, saúde, etc. Bombeiros, policiais, médicos, em certas áreas a ética exige um minimo de planejamento de todo movimento reividicatório, quando parados e em luta por melhores condições de trabalho, individualmente e institucionalmente.Isso é uma coisa, outra coisa é negar a luta de classes, ou a conflituosidade que emerge dentro do estado como nervos expostos de problemas maiores não resovidos. A segurança legitima um sistema que se vangloria por ter anestesiado a história na exata medida em que amplos setores sociais foram "contemplados" nas políticas sociais dos governos populares das últimas duas décadas. O governo tem tudo feito para contemplar as massas em suas demandas básicas, minha casa minha vida, projetos de energia para todos, Prouni, escolas técnicas profissionalizantes, etc. O que é avanço deve ser defendido, e há nítidos avanços. O que precisa ser dito é que ao lado dos avanços podemos ter duas leituras. Uma segundo a qual há um arrefecimento da luta de classes e desde Lula a Dilma, e nesta caso podemos colocar FHC, caminhamos para uma sociedade que tentará domar o leão/mercado, "humanizá-lo", tentando fixar institucionalmente uma sociedade mais centralizada, com menores diferenças sociais e mais apta a pensar por si mesma outros caminhos. Ninguem está seguro com a alternativa dos socialismos reais nem mesmo com o folego curto dos wellfare state, ou sociais democracias em rápida decadência cuja ponta do iceberg é a crise do euro e suas zonas... Uma outra leitura não se contenta com essa processulidade que identii\fica o avanço em termos lineares com o mercado, não perfilando certo xenofobismo do Brasil quinta pontência do mundo, idéia que fascina muitos petistas e certa esquerda ufanista. Claro, estar na história e ter o sentimento de pertencimento a este momento pode até nos massagear o ego, bálsamo para quem deu uma parte da vida por luta por direitos humanos, por exemplo. Ora, mesmo quem apoia o governo e seus acertos, deles é retirada sistematicamente a legitimidade para a crítica de profundidade sobre os horizontes, sobre as anternativas, sobre as rupturas, maiores e menores que devem fazer parte da construçao de uma República mais democratica e democratizante. A condenação do movimento dos policiais nesse aspecto deve do meu ponto de vista ser visto com mais cuidado e respeito.
Em face do que de crítico existe na polícia brasileira, em parte mostrada nos filme Tropa de Elite II...podemos dizer que os líderes do movimento são policiais-cidadãos, pois se mafiosos fossem nào estariam na luta reivindicativa por melhores salarios e condiçoes de trabalho. Os policiais corruptos que enxovalham a imagem de uma instituição deveras importante não me parecem interessados no movimento no que suas pautas explicitam, mas nas suas consequências, uma certa "desordem"que somente amplia as condiçoes de reprodução dos ganhos com o tráfico de drogas.
Chocam as cenas de policiais invandindo prédios publicos, armados, etc. Mas as determinações legais que deveriam pautar éticamente suas ações devem ser sopedadas com a situação de desconforto histórico desses protagonistas do conflito. Há dezenas de anos eles vem pugnando por um piso acima de R$ 1.200,00, chegando ao desejo de dobrá-lo em alguns casos. A demanda é antiga e vem esquentando numa verdadeira panela de pressao. A saída via paralizaçao/ocupação de prédios públicos foi uma saída excepcional em busca de uma interlocuçao com os poderes políticos locais, interlocução bloqueada com promesas incumpridas, ou insuficientes para com homens que colocam suas vidas em risco diuturnamente.
O governo federal e os governos locais estão contengenciados dentro de compromissos de cortes/não ampliação de gastos públicos, pois bem, de acordo aos melhores preceitos do consenso de Washington, em face das politicas neoliberalizantes que o governo segue, nega mais segue. Os militares como trabalhadores, no desespero de ausência de canais institucionais de mediação, e constante desconsideração por suas exigências para um trabalho seguro, leia-se, trabalho com um mínimo de segurança para a segurança de nosso país, esperneiam com as armas que lhes parecem as possíveis. Isso se chama luta de classes. Ponto final. O governo deveria aproveitar a pauta nacional dos policiai para repensar com gente séria, pressuposto que não são estes agente públicos os sicários do tráfico, mas os emissários de uma esperança, a de que uma ordem, democrática, republicana, pressupoe uma valorização profissional e institucional. Essa oportunidade foi perdida e o discurso arrogante e competente do poder estabelecido vai sendo construído na medida em que o movimento arrefece, mas não se considera nem poderia se considerar, morto. Afinal a luta de classes não pode ser eliminada por discursos nem por cooptações/absorçoes do poder e de políticas públicas. Uma ordem velha muda dentro de des-ordens, pressuposto para outras ordens, institucionais, e quem sabe, uma nova ordem social mais ampla.
A ideologia dizia Marx, opera por inversão, construindo representacões e inculcando-as como se verdades fossem... O episódio dos policiais amotinados nos provoca a atualizar os niveis da alienação em tempos de cínica razão histórica do progresso de uma esquerda no poder, fascinada com ele, alienada ela mesma em muitos casos, como neste que insistimos em retomar.
A greve, que as atuais relações capital-trabalho dificultam na iniciativa privada, têm sido amplas no setor público. Até juízes, membros de um poder do Estado, ameaçaram fazê-la, desconsiderando que se voltariam contra a sociedade cujos direitos devem assegurar. O direito de greve é direito social tratado na Constituição em distinto capítulo do que trata das organizações militares.
Sempre foi problemática, ao longo da história, a relação da parcela armada da sociedade com a parcela desarmada. Para evitar chantagem ou subjugação, em Esparta todos os homens eram soldados; outras sociedades excluíam os direitos políticos dos que optassem pela vida militar. Nossa Constituição, que assegura o sigilo telefônico, o direito à intimidade e as prerrogativas parlamentares, atribui a qualidade de cidadãos aos militares, mas veda-lhes a sindicalização e a greve.
Policiais e bombeiros militares têm o direito à existência digna e fazem jus a vencimentos igualmente dignos, dadas s suas funções de proteger a vida e a riqueza alheias. Mas não podem usar as armas que portam autorizados pela sociedade contra a própria sociedade.
Motim não é greve
João Batista Damasceno
Membro da Associação Juízes para a
Democracia
Uma deputada fluminense protesta contra a ilegalidade do grampo em seu telefone e a divulgação manipulada. Diz que parlamentava, com movimento social, sobre demandas de trabalhadores de segurança em greve. Se deputados fossem impedidos de conversar sobre demandas, ainda quando envoltas em ilegalidade, nenhuma lei seria revogada e toda a ordem jurídica seria permanente. Mas tudo precisa ser chamado propriamente pelo que o qualifica, independentemente do efeito que produz. Não se pode chamar de greve a paralisação de militares, sujeitos aos deveres funcionais de hierarquia e disciplina, pois é motim. Não se pode chamar de movimento social aquele tendente a reforçar o poder repressivo do Estado. Da mesma forma, não se pode chamar de trabalhadores de segurança militares armados e fardados pelo Estado, pois têm natureza diversa dos vigilantes particulares.
A greve, que as atuais relações capital-trabalho dificultam na iniciativa privada, têm sido amplas no setor público. Até juízes, membros de um poder do Estado, ameaçaram fazê-la, desconsiderando que se voltariam contra a sociedade cujos direitos devem assegurar. O direito de greve é direito social tratado na Constituição em distinto capítulo do que trata das organizações militares.
Sempre foi problemática, ao longo da história, a relação da parcela armada da sociedade com a parcela desarmada. Para evitar chantagem ou subjugação, em Esparta todos os homens eram soldados; outras sociedades excluíam os direitos políticos dos que optassem pela vida militar. Nossa Constituição, que assegura o sigilo telefônico, o direito à intimidade e as prerrogativas parlamentares, atribui a qualidade de cidadãos aos militares, mas veda-lhes a sindicalização e a greve.
Policiais e bombeiros militares têm o direito à existência digna e fazem jus a vencimentos igualmente dignos, dadas s suas funções de proteger a vida e a riqueza alheias. Mas não podem usar as armas que portam autorizados pela sociedade contra a própria sociedade.
A greve das polícias no RJ foi bem conduzida, sem vandalismos e com a preocupação de não prejudicar a população, sendo mantidos os serviços essenciais. O que deve ser revisto, urgentemente, é a situação crítica das polícias, onde o serviço prestado à população é "capenga", por falta de condições de trabalho. Não falo apenas do salário, mas tb da falta de insumos, da falta de condições mínimas de exercer a função. Convido os Juízes, Promotores e Defensores a visitarem a sede do ICCE/RJ, onde poderão constatar o piso afundando, rachaduras nas paredes, falta de cartuchos para impressão dos laudos. Mas no pátio verão lindos carros MEGANE, FRONTIER, um luxo desnecessário!
ResponderExcluirDenise Rivera
Denise, concordo contigo.
ResponderExcluirSó para esclarecer; OS CARROS A QUE ME REFIRO SÃO VIATURAS OFICIAIS DA POLÍCIA, COMPRADAS PELO NOSSO GOVERNADOR.
ResponderExcluirsomente agora vejo meu texto e o do eminente magistrado Dr Joao Batista Damasceno, o que mt me honra, felicidades a todos e forte abraco edmundo arruda 048-99195516
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